Exhibition, 2014
FRÁGEIS SENTIDOS #1
Margarida Dias / Fotografia
PT/
Margarida Dias: Dois olhares
O desejo de preservar a memória é uma das principais demandas do homem. A fotografia, ao captar o instante, mostra-nos porém que a memória nem sempre é precisa; ela é por vezes maleável, incerta, em constante mudança. A precisão da fotografia, a forma como incide sobre o mundo, complementa por isso a nossa memória. Ela é um dos nossos melhores veículos ao enaltecer as capacidades da memória através da manipulação dos objectos. O seu objectivo é, afinal, aquele que nos move – lutar diariamente contra o esquecimento.
Margarida Dias utiliza neste trabalho uma técnica de incorporação de dois objectos de cerâmica, duas obras de arte, em duas fotografias suas já existentes e impressas, transformando-as, dando às imagens uma nova dimensão sígnica e, consequentemente, poética. Poética pela forma como a fotografia, enquanto arte, incorpora em si outra forma de arte, sem a camuflar, mas inserindo-a noutro contexto. Partindo de um suporte tridimensional, Margarida Dias não foge à sua arte de eleição, denominada ‘fotografia’. Pelo contrário, acompanha uma das tendências artísticas mais actuais, a de combinar a fotografia com outras formas de arte. No entanto, e essa é uma das suas principais características enquanto artista, a fotografia não se submete a qualquer manipulação, do mesmo modo que outras formas de arte não são camufladas na sua fotografia. Ambas co-existem enquanto artes autónomas.
Margarida Dias combina aqui a arte da fotografia com as possibilidades imaginárias da cerâmica. Estas fotografias retratam por isso mais do que uma paisagem, ou pormenores de uma paisagem. Elas são manipuladas com a finalidade de se criar uma terceira obra de arte, aquela que vai para além de qualquer evidência e abre caminho a um discurso que desafia a nossa imaginação. Apesar da incorporação de dois objectos de cerâmica, há uma fidelidade evidente à arte base. Através do jogo de luz e do ponto de vista, reconhece-se a fotografia como um todo, sólido e coeso.
Combinam-se assim neste trabalho dois olhares, duas formas de arte, com a finalidade de criar um objecto único e uno. Um objecto que nos ajude a perceber a memória não apenas como algo acabado, mas como um processo (artístico também). Como diria Sturken, a fotografia é afinal uma ‘memória-tela’, verdadeiro objecto de contemplação para aprofundarmos o nosso sentido de realidade.
Margarida Gil dos Reis
Margarida Dias / CV / Depois de completar o plano de estudos de fotografia (1983/89) do Ar.Co – Centro de Arte e Comunicação Visual, Lisboa, foi convidada para aí continuar como professora (1989/2006). Foi também professora de fotografia no IAO – Instituto de Artes e Ofícios, da Universidade Autónoma de Lisboa. Simultaneamente, prossegue a sua actividade como fotógrafa profissional, tendo colaborado em vários órgãos de comunicação social, em fotografia de Arquitectura, na Revista do Semanário Expresso (1992), Textos e Pretextos (Universidade de Lisboa), Revista A.23 , agências de publicidade, ateliers de design, decoração e de arquitectura.
Foi desde 2003 até Abril 2010, fotógrafa do Teatro Nacional D. Maria II. Com mais de 30 exposições individuais e várias colectivas, está representada em colecções tanto públicas como privadas, quer no estrangeiro (Fondazione Italiana per la Fotografia – Turim, Itália), quer em Portugal (Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa; Encontros de Imagem – Braga; Colecção Culturgest; Colecção PLMJ – Sociedade de Advogados). Margarida Dias tem publicado, desde 2000, um calendário temático com as suas fotografias. Publicou igualmente o livro “O Segredo”, sobre o Atelier do escultor Lagoa Henriques, edição do Arquivo Fotográfico de Lisboa, CML, 2001.
* Apresentação do ciclo de exposições FRÁGEIS SENTIDOS
A loja Objectismo tem como compromisso a divulgação e comercialização de cerâmica modernista portuguesa de produção industrial e de autor. As peças que se apresentam na loja foram produzidas entre meados dos anos 40 até final dos anos 70 e testemunham o que de mais inovador e revolucionário se produziu em cerâmica no Portugal do pós guerra, tanto do ponto de vista técnico como criativo.
Com os olhos postos num passado industrial e estético ainda recente, a Objectismo é também uma galeria que integra e estimula os eventos culturais e criativos do Portugal contemporâneo.
FRÁGEIS SENTIDOS é um ciclo temático de exposições individuais, para o qual serão convidados artistas plásticos, designers, músicos e arquitectos, unidos pela descoberta de estes delicados objectos em cerâmica que proporcionam um rico e abrangente campo de acção para os criadores.
Para a primeira série deste ciclo/ Arte Contemporânea, que se mostra entre 2014 e 2015, foram convidados seis conceituados artistas plásticos que escolheram na Objectismo peças de produção industrial, executadas nas mais importantes fábricas portuguesas como a Fábrica de Louça de Sacavém, a fábrica Secla, nas Caldas da Raínha, a fábrica Aleluia em Aveiro ou a Fábrica Raúl da Bernarda em Alcobaça, assim como algumas peças únicas, realizadas em estúdio próprio ou nas fábricas em que trabalharam os seus autores.
Utilizando a fotografia como memória-tela (#1-Margarida Dias), numa instalação em que revisita emocionais memórias (#2-Ana Pérez-Quiroga), na escultura de uma história (#3-Rui Matos), na performance irónica sobre o uso/função (#4-Miguel Palma), ou simplesmente motivados pela forma, padrão ou cor em complexas aguarelas (#5-Vanessa Chrystie) , estes objectos fundem-se em obras tão frágeis no seu sentido contemporâneo, tal como a matéria cerâmica que as inspira.