Exhibition, 2017
Bruno Castro Santos
DERIVA / Drawing
PT/
Lado a lado, pelas suas formas abstratas, geométricas, pelos grafismos lineares e coloridos as peças cerâmicas da Fábrica Aleluia e os desenhos de Bruno Castro Santos parecem partilhar um espaço comum. Mas estas afinidades, apesar dos ecos formais, são ilusórias. Não é que não se verifiquem correspondências entre ambos; trata-se, todavia, não de semelhanças, mas de complementaridades, de modos de extrair as formas do mundo – etimologicamente, a palavra abstrato vem do latim abs-trahere, que significa separado, removido pela força, do espaço do concreto. Que é precisamente aquilo que a arte faz.
As cerâmicas são, na sua materialidade, coisas concretas. Da roda do oleiro às tecnologias do molde, a sua produção resultou sempre de procedimentos técnicos bem definidos, da procura de uma certeza artesanal sem arbitrariedades. Neste sentido, a sua geometria abstrata é análoga àquela das cerâmicas produzidas na China ou na Grécia antigas. As peças Aleluia das décadas de 1950/60 eram objetos decorativos que testemunhavam uma nova sensibilidade e as suas formas abstratas, emprestadas do mundo da arte, assinalavam, no espaço doméstico, um estilo de vida moderno (as artes aplicadas, outrora conhecidas por decorativas, servem melhor as problemáticas da história da cultura material do que as artes plásticas).
Face aos desenhos de Bruno Castro Santos não conseguimos, como fazemos com as cerâmicas Aleluia, separar o que neles é abstrato daquilo que é concreto. Nas artes plásticas, a abstração configura uma história complexa, uma genealogia que recua outros 50 anos, aos primórdios do século XX, onde se inventavam os programas estéticos e políticos para uma nova perceção. Com Malevich, Delaunay, Kandinsky ou Klee (“A arte não reproduz o visível, ela torna visível”), a abstração cumpria uma agenda que era, essencialmente, uma resistência. Porém, um século depois, a dicotomia entre o figurativo e o abstrato que sustentou aqueles programas não é a mesma e cedo percebemos que estes desenhos não obedecem a um qualquer manifesto, não cumprem uma agenda decorativa, nem tratam sequer da exploração analítica das formas, à maneira da Gestalt… Tudo o que nele podemos testemunhar é o modo como aquelas linhas, nas suas geometrias abertas, na sua estreita relação com o branco do papel servem um propósito concreto: a captura do espaço do desenho, do espaço físico que constitui cada desenho. Aquelas formas abstratas não representam o espaço, elas convocam-no.
Philip Cabau, Setembro de 2017
A exposição DERIVA de Bruno Castro Santos (n.1972), apresentou um exclusivo e selecionado conjunto de 4 desenhos em paralelo com peças cerâmicas da Fábrica Aleluia produzidas na década de 50.
Extraordináriamente inventivas do ponto de vista formal e gráfico, as jarras, caixas e travessas da Fábrica Aleluia que se destacam, foram pintadas manualmente com padrões geométricos, conjugando a linha com a cor plana num evidente apelo gráfico, sublinhando os detalhes e acentuando a organicidade dos volumes. Fixas na cerâmica vidrada, as decorações destas peças são apenas um frágil propósito para a relação que se estabelece com os desenhos de Bruno Castro Santos, de onde pulsam ritmos de uma equilibrada sensibilidade, minuciosa vibração de linhas, traços, cor e tramas que se vêem ou apenas se sentem, fixos no papel, mas igualmente frágeis e instáveis.
Com este íntimo e justificado desvio, estes desenhos permitem-nos confirmar que o mundo é uma teia complexa de derivas, um fluxo infinito sem destino, em que nada é estático e tudo se relaciona.”
Com a exposição DERIVA e Bruno Castro Santos, a Objectismo retoma em 2017, o propósito de colaborar com artistas plásticos contemporâneos em cuja linha de trabalho se encontra motivo sensível à contaminação pelos objectos em cerâmica apresentados na galeria, tal como aconteceu com o ciclo de exposições Frágeis Sentidos / Arte Contemporânea, realizado entre 2014/15, com obras de Margarida Dias, Ana Pérez-Quiroga, Rui Matos, Miguel Palma e Vanessa Chrystie.
Bruno Castro Santos (Lisboa.1972)
Entre 1990 e 1998 estuda arquitectura no Southern California Institute of Architecture e completa o mestrado em Advanced Architectural Design em Columbia University, NY. Em 2012 conclui o curso avançado de desenho e pintura do Ar.Co, onde participa em exposições coletivas em 2009, 2010 e 2011. Em 2013 integra a exposição coletiva Ar.Co Bolseiros e Finalistas’012, no Museu da Cidade, em Lisboa e a exposição coletiva internacional Portas Abertas, no Fórum Eugénio de Almeida, em Évora. No mesmo ano realiza a sua primeira mostra individual no Museu Nacional de História Natural em Lisboa, com desenhos de grande formato da série RED. Desde então, tem exposto regularmente em Portugal e no estrangeiro onde se destaca a exposição coletiva no CAC Málaga, Centro de Arte Contemporânea. Integra várias colecções privadas e institucionais tais como Colecção Figueiredo Ribeiro, Museu da Presidência da República, Fundação Benetton e do Centro de Arte Contemporânea de Málaga.